08 agosto 2015

Não ao fim da rubrica "Cantos da Casa"!

Desde o passado 17 de Julho, último dia de um ciclo consagrado à Brigada Victor Jara, a rubrica "Cantos da Casa" não mais apareceu na emissão da Antena 1. Supus, na minha boa-fé, que se tratasse de uma pausa estival devida às merecidas férias do seu autor e realizador, o Sr. Armando Carvalhêda. Entretanto, recebi de fonte fidedigna a informação de que foi Rui Pêgo, sem dizer "água vai!", quem resolveu eliminar da grelha aquela que se havia tornado uma das (poucas) marcas de excelência da Antena 1. Perguntamos: qual o motivo? Os artistas e os discos que o Sr. Armando Carvalhêda vinha divulgando estão tão profusamente representados na lista de difusão musical, vulgo 'playlist', que o apontamento se revelava redundante e supérfluo? Não. Na 'playlist', quase não há música tradicional. Mas mesmo que houvesse em abundância, ainda assim o espaço "Cantos da Casa" não deixaria de ter muita razão de ser, justamente por fazer a contextualização do repertório e dos intérpretes, coisa bem diferente do que acontece com a 'playlist' em que a música é atirada a seco e sem o mais pequeno enquadramento. Acresce que havendo um espaço específico para a música tradicional (ou regional, como Michel Giacometti e Fernando Lopes-Graça preferiam designá-la) e num horário certo, os seus apreciadores sabem de antemão onde encontrá-la. De igual modo, os músicos que a ela se dedicam, recriando-a com paixão e bom gosto, também sabem que existe no éter nacional uma janela de divulgação (ainda que estreita) para o trabalho que vão desenvolvendo, por imperativos artísticos e por amor ao nosso ancestral e riquíssimo cancioneiro popular. Então, em que ideia assenta a supressão dos "Cantos da Casa"? É por as 'majors' discográficas entenderem que a música tradicional portuguesa não tem valor de mercado? Se é esse o argumento, cumpre-nos lembrar a Rui Pêgo (e, bem assim, a quem lhe é hierarquicamente superior) que a estação pública não existe para funcionar como um veio de transmissão dos produtos (e subprodutos) que as multinacionais do disco querem vender. A rádio estatal existe – e só nesse pressuposto se justifica o financiamento público – para dar visibilidade (ou audibilidade, melhor dizendo) a tudo o que, com reconhecível qualidade, se edita em Portugal, independentemente de ter ou não a chancela das editoras mais poderosas e influentes. E de entre toda essa produção de qualidade, a nossa música mais identitária deve merecer, como é óbvio, uma atenção muito especial. Nesta ordem de ideias, a abolição da rubrica "Cantos da Casa" é de todo descabida e contrária ao mais elementar bom senso. Se Rui Pêgo, fiel à caturrice que o caracteriza, teimar em não reconsiderar a sua desastrosa medida, então que a administração da Rádio e Televisão de Portugal tenha a clarividência de o demitir e de confiar a direcção de programas a uma pessoa mais competente e conscienciosa da missão de serviço público que cabe à Antena 1 prosseguir.
Os ouvintes/contribuintes que amam a bela música tradicional portuguesa clamam a uma só voz: «Não ao fim da rubrica "Cantos da Casa"!»