20 novembro 2007

A seca que a Antena 1 deu a Fausto... e aos ouvintes

Do "Programa da Manhã", da Antena 1, a minha audição há meses que se restringe ao período que vai da rubrica 50 Anos de Canções Portuguesas, por volta das 7:40 (a minha hora de despertar), até à leitura dos títulos dos jornais por João Paulo Guerra, cerca das 8:25. Depois disso, o "Programa da Manhã" é para mim uma coisa imprópria para consumo. Portanto, atendendo a que a Antena 2 se tornou, na mesma faixa horária, também em algo de intragável a quem preza a sua sanidade mental, e não estando eu disposto a ser bombardeado com as doses industriais de publicidade das rádios privadas, a solução de recurso é ouvir música escolhida por mim. No entanto, ontem, dia 19 de Novembro, ao dar-me conta que Fausto Bordalo Dias era o convidado especial do referido "Programa da Manhã", a pretexto do lançamento de uma colectânea de canções de amor e dos 25 anos da edição de "Por Este Rio Acima", lá fiquei ligado à Antena 1, convencido de que ia ouvir uma mão-cheia de músicas suas e, claro está, também pelo interesse em ouvi-lo de viva voz a falar sobre a sua obra. Mas tudo não passou de uma esperança vã! Afinal de contas, de Fausto a falar da sua música, em todo o programa, apenas uns escassos minutos dispersos e de temas seus só consegui ouvir um, "Rosalinda". Mas deram-me a ouvir Cool Hipnoise, Patti Smith e Paulo Gonzo. Fiquei perplexo! Então convida-se um cantor para um programa de rádio com o suposto intuito de promover o seu último lançamento discográfico e depois atiram-lhe(nos) para acima com músicas de outros?! Dá para entender? Eu não sou dotado de poderes para perscrutar a mente de Fausto Bordalo Dias, mas imagino a incomodidade e o aborrecimento tremendo que o homem deve ter sentido em tal situação: assistir à transmissão de canções alheias (de baixo quilate) em lugar das suas e ainda por cima ter de gramar com intermitentes ladainhas do trânsito, blocos de desporto, notícias bastas vezes repetidas, 'spots' promocionais de todo o género, 'jingles' pirosos, e todas as outras enxúndias que preenchem aquele espaço de quatro horas de emissão. Ele lá conseguiu aguentar até ao fim, é verdade, mas vontade de dar à sola não lhe deve ter faltado. E se não bateu com a porta, terá sido por delicadeza, e quiçá com receio de que com essa atitude o tornassem um dos proscritos (mais um a somar a tantos outros) da 'playlist' da Antena 1.
Eu fiquei deveras defraudado com a experiência e muito dificilmente me vão apanhar outra vez a ouvir a Antena 1 depois das 8:30. E como ontem, ao contrário do que me fizeram crer, não se falou do álbum "Por Este Rio Acima", o mínimo que se deve exigir à direcção da Antena 1 é que seja ainda realizado, pelo menos, um programa temático a ele especialmente dedicado. Justamente por não se tratar de um disco qualquer e porque a sua repercussão na música portuguesa foi imensa mas ainda não suficientemente avaliada e analisada. Quanto à nova colectânea, e tirando as poucas palavras que Fausto teve oportunidade de proferir sobre ela, confesso que para mim ela de pouco vem adiantar pois possuo praticamente toda a sua discografia. Em todo o caso, e não ignorando o propósito meramente comercial da edição, pode ser que com ela algumas pessoas menos conhecedoras do repertório do artista o venham a descobrir e se sintam motivadas a ir à procura dos álbuns de originais.
E a propósito de álbuns de originais, há muitos outros grandes discos da música portuguesa que neste ano de 2007 fazem anos (em decénios ou múltiplos de quinquénios). Um deles chama-se "Canções de Amor e de Esperança", de Luiz Goes, gravado em Dezembro de 1971 mas lançado já em 1972 (portanto, há 35 anos), e uma das obras-primas absolutas da música portuguesa de todos os tempos. E por coincidência, o cantor também completa 75 anos de idade, já no próximo dia 5 de Janeiro. Portanto, e a exemplo das iniciativas que foram levadas a cabo no âmbito das efemérides das mortes de José Afonso e de Adriano Correia de Oliveira, é de toda a oportunidade que Luiz Goes tenha um tratamento idêntico na rádio pública. Precisamente por ser um dos intérpretes superlativos da música portuguesa de sempre. E contando-se ele ainda no número dos vivos maior a premência em que o reconhecimento que lhe é devido seja dado em vida. Fica a chamada de atenção, para que a rádio pública não deixe passar a ocasião "como cão por vinha vindimada", o que aliás não seria caso inédito desde que António Cardoso Pinto abandonou os comandos da Antena 1.
E já agora, por que razão Luiz Goes ainda não foi incluído na 'playlist' da Antena 1, desde que publiquei um texto sobre a sua vida artística na
Galeria da Música Portuguesa e de que tive o cuidado de remeter cópia à direcção da rádio pública? Será que a 'playlist' é um feudo exclusivo do Ricardo Soares e Rui Pêgo não tem voto na matéria? É a ideia com que se fica!

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