30 janeiro 2007

Música na Antena 1: pequenos e grandes formatos

Exmo. Sr. Provedor do Ouvinte da Rádio Pública,

Antes de mais, devo confessar que nem tudo o que tenho ouvido da boca do Sr. Rui Pêgo em resposta às questões formuladas pelo Sr. Provedor me têm agradado, mas registo com satisfação o anúncio de uma maior atenção na Antena 2 para o teatro radiofónico e para outros conteúdos no campo das artes e do conhecimento. Estaremos cá para ver! Agora fico bastante apreensivo quando Rui Pêgo vem falar em "radio art", a propósito de teatro e de arte, porque não vejo qualquer relação entre a arte em geral e as colagens caóticas e assaz enfadonhas de excertos de programas em várias línguas, que passaram a pontuar as madrugadas de fim-de-semana da rádio clássica. Não sei de quem partiu a ideia de chamar "radio art" a esses produtos intragáveis, mas quem quer que seja devia ter uma noção bastante bizarra do conceito de arte.
Indo agora ao assunto que me impeliu a escrever, e dado que o Sr. Rui Pêgo não se tem dignado responder às cartas que lhe tenho endereçado, peço ao Sr. Provedor o especial favor de o questionar sobre os pequenos e grandes formatos musicais da Antena 1. Gostava que o director de programas do principal canal generalista da rádio pública portuguesa me desse uma razão plausível e admissível para o facto da música anglo-americana, além de um pequeno formato – "Outras Histórias da Música" (Pop/Rock) –, ter também um grande formato – "Ondas Luisianas" – de duas horas semanais e em dose dupla (depois da meia-noite de sexta-feira e sábado à tarde) e isso não acontecer relativamente às músicas da portugalidade (fado e música de matriz tradicional) e da latinidade, sintomaticamente restringidas a mini-formatos, quais ilhotas perdidas no largo oceano. Sendo a Antena 1 uma rádio portuguesa, e ainda por cima pública, não consigo entender esta estranha situação. Será que na britânica BBC Radio e na americana National Public Radio as músicas matriciais anglo-saxónicas estão também reduzidas a formatos de cinco minutos de duração diária e os grandes formatos são reservados à música portuguesa e lusófona? Quero que fique bem claro que não estou a pôr em causa o programa "Ondas Luisianas" e o seu autor, Luís Filipe Barros. Digo isto perfeitamente à vontade porque até gosto do programa, sobretudo da segunda hora. Só não consigo entender, nem aceitar, que não haja programas similares na Antena 1 dedicados às músicas mais autênticas do mundo lusófono e latino que, como todos sabemos, são deliberadamente excluídas da 'playlist'. Os mini-formatos "Cantos da Casa" (música tradicional), "Alma Lusa" (fado) e "Júlio Isidro" (música latina) têm mostrado que não é por falta de material que não existem grandes formatos nessas áreas musicais. E também não é certamente por questões orçamentais porque nas antenas internacionais da RDP há bons programas que podiam ser aproveitados para a grelha da Antena 1, e para grande proveito dos ouvintes residentes em Portugal continental e insular. Então, qual será a razão?
Com os melhores cumprimentos,

Álvaro José Ferreira

16 janeiro 2007

Antena 2: mudanças positivas mas insuficientes

No início do ano, a grelha da Antena 2 voltou a ter novas mexidas que me merecem alguns comentários. Em primeiro lugar, começo por me congratular com a mudança de "Questões de Moral" e de outros programas de autor para as 23:05 horas (em vez da meia-noite como acontecia até agora) sendo repetidos às 12:00 no dia homónimo da semana seguinte. Positivo é também os programas que tinham periodicidade quinzenal passarem a ter periodicidade semanal e alguns programas do fim-de-semana como "Em Sintonia com António Cartaxo" ou "Um Certo Olhar" que, até agora, eram emitidos uma única vez, passarem a ter outra transmissão (às 16 horas, durante a semana), o que dá mais possibilidades de audição a ouvintes com hábitos de escuta e disponibilidades de tempo diferentes. Outra alteração que considero positiva, foi a criação de mais um espaço para a transmissão de concertos – "Salão Nobre" (de segunda a sexta-feira, 14:00) – que conjuntamente com o "Grande Auditório" (de segunda a sexta-feira, 21:00), dá aos melómanos uma oferta muito razoável da música que se vai tocando nos principais festivais e recitais, quer estrangeiros quer nacionais. Saúdo também o regresso de um programa de ciência – "Laboratório" (domingo, 13:30) – e também de uma nova rubrica de poesia – "Voz Alta" (de segunda a sexta-feira, 23:00) – na qual os nossos poetas dizem poemas da sua lavra. Já tinha chamado a atenção para o facto da única rubrica de poesia até agora existente na rádio pública – "Os Sons Férteis" – passar apenas uma vez por dia (às 11:00) e não ser repetida (sobretudo a pensar nos ouvintes não informatizados) e, nessa medida, é de saudar que a poesia recitada tenha agora mais um cantinho na Antena 2 (na Antena 1 é que continua a faltar!). Ainda em maré de coisas positivas, devo confessar a minha satisfação pelo surgimento de um novo programa de evocações – "Além Tempo", de Luís Ramos (sábados, 12:30) –, que vem colmatar a lacuna que se fazia sentir desde meados de 2005, quando foi inexplicavelmente extinto o programa "Evocações". E pelo que me foi dado ouvir até agora, também me agradaram os novos programas de autor de temática musical: "Caleidoscópio", de Luís Ribeiro (sábados, 21:00; segundas, 16:00); "Memória do Som", de Piñeiro Nagy (domingos, 21:00; quartas, 16:00); "Cosmorama", de Alexandre Branco e Ana Telles (terças, 12:00, 23:05). Já não posso dizer o mesmo de "Fuga da Arte" (sábados, 24:00) e de "Vias de Facto" (domingos, 24:00), dois programas que, pelos tipos de música neles contemplados, estão totalmente deslocados na Antena 2 constituindo autênticas aberrações na grelha. Aliás, existe uma clara dualidade de critérios quando se extingue o "Café Plaza", por alegadamente passar música não adequada à Antena 2 e se mantém programas com músicas que, além de destoarem na rádio clássica, ferem a sensibilidade e o gosto de boa parte dos ouvintes. Também não gostei que o programa "Páginas de Português" que era transmitida à hora de almoço de domingo (13:30) tenha sido catapultado para as 17:00, um horário muito mais ingrato. E lamento também – e profundamente – a não continuação de "Páginas Esquecidas", de Ana Paula Ferreira, que para mim era a rubrica mais interessante da Antena 2, logo a seguir ao apontamento de poesia e música de Paulo Rato. A este propósito, não posso deixar de manifestar o meu descontentamento pela desvalorização / marginalização que a cultura humanística fora do universo musical vem sofrendo na Antena 2. Vejamos: além das duas rubricas de poesia e dos programas "Questões de Moral" (reflexão), "Páginas de Português" (língua portuguesa) e "Lugar ao Sul" (cultura tradicional) e, em parte, "A Força das Coisas" (magazine de Luís Caetano), tudo o mais são espaços de entrevista (ou de comentário) e pequenos formatos sobre a actualidade cultural (novidades discográficas, novidades literárias, filmes em estreia, peças em cena, exposições, concertos). É importante que haja entrevistas e espaços sobre os eventos culturais que vão acontecendo no país, mas o serviço público de rádio pressupõe algo mais: aproveitar as potencialidades e peculiaridades da rádio para a produção / divulgação de conteúdos nos vários campos do Saber e das Artes. Neste contexto, é pertinente referir a História, a Literatura e o Teatro, áreas em que rádio podia desempenhar um importante papel e nalgumas situações até insubstituível. E tudo isso podia ser feito a custo zero pois bastaria fazer uso do riquíssimo arquivo histórico, um acervo imenso mas quase totalmente inexplorado. Convém lembrar que nesse arquivo, quer a História, quer a Literatura, quer o Teatro, têm uma larga e profusa representatividade. Começando pela História, faço uma referência muito especial a uma extraordinária série de programas da autoria de Maria João Martins intitulada "Na Máquina do Tempo" que, de uma forma muito aliciante, nos mostrava o lado menos institucional e escolástico de vários temas da História de Portugal. Ainda guardo uma gratíssima memória, pelo encantamento que me causou e pelo muito que aprendi, de um programa dedicado à evolução histórica daquele que é talvez o maior mito português – o sebastianismo. Ainda neste âmbito, tenho também de referir os ciclos temáticos que se fizeram sobre acontecimentos marcantes e figuras de relevo da História da Humanidade – escritores, poetas, dramaturgos, artistas, pensadores, cientistas, exploradores, estadistas, filantropos. Depois do ciclo que em 2005 foi dedicado a Bocage, a propósito dos 200 anos da morte do poeta, e com excepção de um programa sobre Rembrandt em meados de 2006, nada mais existiu, o que constitui uma grave omissão do serviço público. Por que motivo não se resgatam do arquivo esses conteúdos, a exemplo do que tem sido feito com as gravações musicais? E isto aplica-se, com igual propriedade, ao teatro radiofónico e a programas de divulgação / fruição literária. Já tratei do teatro no texto em que prestei o meu modesto tributo a Eduardo Street e, por isso, cumpre-me mencionar agora a leitura de livros. Por que razão não se dá a ouvir o que de melhor se fez neste campo? Por exemplo: "A Pequena Crónica de Anna Magdalena Bach" lida por Carmen Dolores; as "Viagens na Minha Terra", lida por Carlos Acheman; a "Peregrinação" (de Fernão Mendes Pinto), esta com uma soberba leitura de José Mário Branco numa magnífica realização de Margarida Lisboa). Eu iria até mais longe: a RDP prestaria um relevante serviço cultural ao país se procedesse à edição de audiolivros, que até poderia ser feita em parceria com um jornal de circulação nacional e/ou em protocolo com o Instituto do Livro e das Bibliotecas e com o Ministério da Educação, com vista à sua distribuição pela rede de bibliotecas públicas e pelas escolas do ensino básico. E se isto é verdade para a ficção, não deixa de o ser também para a poesia recitada e para o teatro radiofónico, um património de uma extraordinária riqueza no arquivo histórico e de uma valia inestimável mas escandalosamente desaproveitado. Numa altura em que se fala tanto de conteúdos áudio e vídeo, de que é que a rádio pública está à espera quando tem à sua disposição o maior e mais rico acervo fonográfico existente em Portugal? É altura do arquivo da RDP deixar de ser encarado como um cemitério – como apropriadamente lhe chamou Adelino Gomes – e que as preciosidades que lá existem sejam resgatadas para a luz do dia, quer através de edições discográficas, quer com a colocação na internet. No tocante a edições discográficas, já se começou a fazer alguma coisa (a caixa com obras de Fernando Lopes Graça é uma iniciativa muito louvável), mas na área dos registos não musicais ainda nada foi feito. Para mim, constitui um crime contra a memória e contra a cultura deixar o valiosíssimo arquivo histórico da RDP a apodrecer sob o pó do esquecimento, sem que ninguém dele possa tirar proveito. Porque só se ama o que se conhece e um arquivo fonográfico que não é dado a conhecer e não é fruído é como um livro que permanece fechado e não é lido. É como se não existisse, só que no caso do arquivo sonoro houve um investimento de dinheiros públicos em suportes de gravação e respectiva conservação que importaria fazer render (em todos os sentidos). E depois há a questão dos cidadãos cegos ou com deficiência visual de quem a rádio pública se parece ter esquecido. Volto a lembrar que tanto o teatro radiofónico como a leitura de livros são duas modalidades especialmente úteis aos invisuais que não podendo usufruir dos meios visuais (livros, televisão, artes cénicas, etc.) e ou não tendo acesso a literatura em Braille ou audiolivros (ainda há muitas bibliotecas públicas que os não disponibilizam) é legítimo que possam encontrar na rádio resposta às suas necessidades culturais.

10 janeiro 2007

Em defesa do programa "Ritornello"

Antes de mais, começo por me solidarizar com Jorge Rodrigues, o autor e apresentador do programa "Ritornello" pois tenho o grande prazer e proveito de pertencer ao vasto auditório que costuma ouvi-lo ao fim da tarde, na Antena 2. Além de ser um profissional de alto gabarito e um grande conhecedor do repertório erudito e respectivos intérpretes, Jorge Rodrigues possui também uma das melhores vozes da Antena 2, coisa nada despicienda numa rádio onde o serviço de locução sofreu nos últimos tempos uma acentuada degradação. A somar a isso, os convidados que criteriosamente escolhe para levar ao estúdio representam um motivo de acrescido interesse para o ouvinte por lhe permitir desvendar o lado menos institucional e menos cinzento das figuras públicas, designadamente através das suas escolhas musicais. Foi através do "Ritornello" que fiquei a conhecer os gostos musicais de figuras tão importantes como Eugénio de Andrade, Mário Cláudio ou José Saramago, entre outras. E jamais esquecerei a emissão em que participou, via telefone, de D. Mécia de Sena, viúva de Jorge de Sena, emissão essa especialmente dedicada aos magníficos poemas alusivos a obras-primas da música erudita ("Variações Goldberg" de Bach, "Requiem" de Mozart, etc.) que o grande poeta escreveu no livro "Arte de Música". Por tudo isto, não posso compreender, e ainda menos aceitar, a proibição imposta a Jorge Rodrigues de fazer entrevistas no seu programa, restringindo-o à função de tocador de CDs. Em primeiro lugar, e sem pôr em causa a autoridade da direcção na definição das linhas orientadoras da programação, compete à mesma direcção respeitar a liberdade e a autonomia dos realizadores no exercício do seu métier. Ora o "Ritornello" é um programa de autor e ainda por cima em directo e, como tal, faz todo o sentido que o realizador tenha a liberdade de poder contar com a participação, presencial ou à distância, de pessoas que, a seu ver, possam dar um contributo válido para a valorização do serviço público. Neste sentido, a limitação imposta pela direcção, além de descabida, parece-me abusiva e, indubitavelmente, lesiva da dignidade e do brio profissional do autor do programa. Em segundo lugar, estamos a falar, nem mais nem menos, do programa de maior audiência da Antena 2, facto que deve ser salientado e enaltecido porque conseguido por mérito do autor e sem descer na fasquia de qualidade e sem cedências à mediocridade. E se o programa regista tão altas audiências é porque os exigentes ouvintes da Antena 2, a par da música, também apreciam as conversas que Jorge Rodrigues entabula com os seus convidados, pormenor que a direcção devia ter em conta. A menos que Rui Pêgo queira ter a pretensão paternalista e arrogante de achar que os ouvintes estão errados e que ele, na sua superior infalibilidade, é que sabe o que é bom para eles. Em terceiro lugar, não consigo entender a razão para, de um momento para o outro, não poder haver entrevistas no "Ritornello" quando elas existem no programa congénere do período da manhã, o "Império dos Sentidos". Com que critério e fundamento é que Rui Pêgo quer banir as entrevistas na viagem de regresso do emprego e as mantém na viagem de ida para o mesmo? A meu ver, a audição de uma entrevista faz muito mais sentido na viagem de regresso porque, em princípio, o ouvinte já não tem a pressa e a azáfama de chegar a tempo ao emprego e, como tal, pode dispensar outro tempo e atenção à audição de uma conversa. Como tal, o argumento apresentado por Rui Pêgo ao Correio da Manhã de um alegado servilismo não tem a mínima consistência e razoabilidade porque se Jorge Rodrigues dá voz a pessoas que criticam o Governo e as suas opções para a Cultura não seria eticamente aceitável que não desse oportunidade a representantes do Governo para exporem também as suas razões. É assim que as coisas funcionam em democracia, mas Rui Pêgo (e a administração que o mandatou) parece não perceberem essa coisa elementar. Ou será que a direcção da RDP para não ser acusada de alinhamento com o Governo (a exemplo do que tem acontecido com a televisão pública), se apressou a aproveitar este caso para fazer um frete encapotado ao Governo, calando na rádio pública as vozes incómodas? Em qualquer dos casos, estamos em presença de uma atitude claramente censória, que jamais se poderá aceitar num regime em que a liberdade de expressão está constitucionalmente consagrada e, ainda por cima, tratando-se de um órgão de comunicação social público. Não obstante, não descarto a hipótese deste caso ser um pretexto com outros fins pérfidos que publicamente não se quer assumir. Quer me parecer que o condicionamento imposto a Jorge Rodrigues e o ataque à sua dignidade profissional, tenha o propósito velado e não assumido de o irradiar de antena, o que aliás não seria caso inédito (veja-se o que aconteceu a Rui Dias José, Graça Vasconcelos, António Cardoso Pinto e Francisco Sena Santos). E não digo isto por mera especulação, já que a amputação da segunda hora do "Ritornello", em Setembro passado, representa por si só um desinvestimento no programa por parte da direcção e uma clara afronta ao seu autor, o qual já fora desconsiderado – é bom não esquecer – quando extinguiram o seu "Operamania" e não lhe entregaram o programa substituto, o "Cantabile". Estou em crer que o que se está a passar com o "Ritornello" se insere na estratégia da terra queimada, que passou a vigorar na Antena 2, com a extinção de programas modelares e a irradiação dos melhores profissionais para dar lugar aos tais mancebos 'imberbes' e a alguns colaboradores externos perfeitamente dispensáveis e supérfluos.
Por tudo isto, enquanto cidadão e ouvinte da Antena 2, não posso deixar de repudiar o ataque ao grande profissional que é Jorge Rodrigues e ao seu (e nosso) "Ritornello".

03 janeiro 2007

Música portuguesa na RTP: filhos e enteados



É hábito as televisões portuguesas, na quadra natalícia, melhorarem a grelha sobretudo com a exibição de filmes e a transmissão concertos de música. A RTP-1 também cumpriu a tradição, mas no caso da música portuguesa fê-lo da pior maneira. Começo pelos horários: Marco Paulo, Tony Carreira e Anjos passaram em horário nobre enquanto que José Mário Branco, João Braga e Camané foram atirados para a madrugada. Por exemplo, o concerto de José Mário Branco que teve como convidados nomes tão importantes como Fausto Bordalo Dias, Júlio Pereira, Filipa Pais e José Peixoto passou – pasme-se! – depois das 2:30 da madrugada. Desconheço qual o critério usado pela direcção de programas da RTP-1 para a desigualdade de tratamento dada aos vários artistas da nossa praça, mas partindo do pressuposto que pesou uma suposta maior popularidade de uns em relação a outros, então a televisão pública prestou um péssimo serviço público. A televisão pública não pode nem deve andar atrás de audiências mas tão-somente procurar apresentar o melhor serviço que está ao seu alcance. Nem vou ao ponto de dizer que nomes como Marco Paulo, Tony Carreira e Anjos (incluindo todos os 'Pimbas' que costumam marcar presença nos programas da manhã e da tarde) não devem ter lugar na televisão pública mas já não posso aceitar, de forma alguma, a marginalização de que cantores / intérpretes de créditos firmados e de qualidade incontestada vêm sendo alvo. E digo isto não tanto pela consideração de que tais artistas são credores, mas apenas pelo respeito que a direcção de programas da RTP-1 devia ter pelos telespectadores seus apreciadores. Assim fica-se com a ideia que de que para a televisão estatal só interessam os apreciadores de Marco Paulo, Tony Carreira, Anjos e afins enquanto que os demais telespectadores não contam para nada. Ou servirão apenas para pagar a taxa do audiovisual?
E como se isto não bastasse, constata-se ainda que muitos artistas de qualidade reconhecida (entre os quais algumas figuras de referência da música portuguesa) nem sequer têm acesso à televisão do Estado, mesmo em horários esconsos, o que me parece muito grave. Por que motivo os telespectadores da televisão pública não podem ver / ouvir uma Mísia, uma Aldina Duarte, uma Ana Laíns, uma Amélia Muge, um Pedro Barroso, um Vitorino, um Janita Salomé, um Eduardo Ramos, um Rão Kyao, um Júlio Pereira, um Pedro Caldeira Cabral, um José Peixoto, um Pedro Jóia, uns Frei Fado d'El Rei, isto para já não falar em tantos e bons agrupamentos de música folk / tradicional – Aqua d'Iris, At-Tambur, Belaurora, Brigada Victor Jara, Canto da Terra, Charanga, Chuchurumel, Contrabando, Danças Ocultas, Dar de Vaia, Dazkarieh, Gaiteiros de Lisboa, Galandum Galundaina, Lúmen, Maio Moço, Mandrágora, Marenostrum, Melodias do Vento, Moçoilas, Modas ao Luar, Mu, José Barros e Navegante, Nem Truz Nem Muz, Ódagaita, Pedra d'Hera, Popularis, Quadrilha, Real Companhia, Realejo, Roda Pé, Roldana Folk, Ronda dos Quatro Caminhos, Rosa Negra, Segue-me à Capela, Som Ibérico, Terrakota, Trovas à Toa, Vá-de-Viró, Vai de Roda.
Não competiria à televisão que todos financiamos dar a conhecer ao grande público o que de melhor se faz em Portugal em matéria de música popular? Será razoável que o dinheiro dos contribuintes seja desbaratado com os produtos de mais baixo nível, e se sonegue o que tem mais qualidade e autenticidade? Uma das atribuições do serviço público de televisão não é a promoção da língua e cultura portuguesas? Ou será que o Sr. Nuno Santos entende que a música pimba e a música de cassete pirata são o que melhor representa a cultura portuguesa?